No dia 23 de março celebramos o dia mundial do meteorologista e afinal, por que o trabalho desse profissional se tornou tão importante na área de energia?
Dado que meteorologia é a ciência que estuda os fenômenos atmosféricos, focando na climatologia e previsão do tempo, sua relação com o sistema eletroenergético é de fato estreita. Haja visto que no total da matriz de geração brasileira as fontes hidráulica, eólica e solar representam respectivamente 63%, 10%, 2% (PDE 2031), ou seja, 75% da produção de energia nacional é composta por fontes altamente correlacionadas com fenômenos meteorológicos, tais como: precipitação, ventos e radiação solar.
Em termos estruturais, o CPTEC (Centro de Previsão de Tempo e Estudos Climáticos) e o INMET (Instituto Nacional de Meteorologia) contam com uma rede estimada em mais de 2.000 estações meteorológicas entre públicas e privadas (de superfície, convencionais ou automáticas) coletando dados horários, que em conjunto com imagens de satélites (geradas a cada 30min, 1h ou 3hs) serão usados como insumos nas simulações das previsões de tempo simuladas por supercomputadores para o curto, médio e longo prazos, lembrando que quanto maior o período de previsão menor a credibilidade das informações.
Como mencionado acima, no setor energético brasileiro a base da matriz de geração depende das previsões meteorológicas, sendo assim, as informações previstas pela meteorologia impactam toda a cadeia eletroenergética nacional, não somente a projeção da geração, como também a eficiência da rede de distribuição/transmissão e até os preços finais negociados nos mercados regulado e livre.
Cada fator meteorológico tem sua respectiva influência. Por exemplo, o regime de chuvas é distinto por região do Brasil e afeta diretamente a produção de energia hidráulica já que a quantidade de precipitação impacta nas vazões que, por sua vez, influência na geração das usinas e por consequência nos níveis dos reservatórios. No caso da produção de energia eólica e solar, a sazonalidade da geração também é influenciada pelo regime de chuvas, assim como pela região do país, sendo sua previsão usada para estimar a capacidade de geração e manutenção dos parques eólicos e fotovoltaicos. As intempéries climáticas também afetam o setor de distribuição e transmissão de energia, sendo seu monitoramento muito usado na prevenção e manutenção das linhas de transmissão evitando danos ao sistema. Outro importante produto meteorológico é a previsão de temperaturas, pois dependendo da época do ano e da localização, impacta diretamente na expectativa de demanda das regiões, dado que o consumo de energia é afetado pela carga de refrigeração.
No âmbito da formação dos preços de energia, as previsões meteorológicas, entram como input determinante nas simulações dos modelos que calculam os preços para todos os horizontes de tempo (curto, médio e longo prazos). De forma simplificada, o preço de energia é resultado de simulações que buscam otimizar o despacho ótimo usado para atender um incremento de carga, considerando todas as variáveis que compõe o sistema elétrico brasileiro, tais como: vazões, carga, armazenamento, intercâmbio, restrições hidráulicas, térmicas e elétricas, entre outras. Como resultado dessas simulações é obtido o CMO (Custo Marginal de Operação) que por sua vez, através de simulações desconsiderando algumas restrições intercâmbio internas entre as regiões, dará origem ao PLD (Preço de Liquidação das Diferenças) que é a componente principal do preço da energia que será negociada no ACL (ambiente de contratação livre).
Dado que a previsão meteorológica é caracterizada por grande variabilidade espacial e temporal e seus resultados impactam fortemente na expectativa das vazões, principal dado de entrada dos modelos de otimização da operação e preço de energia, os acertos ou erros decorrentes dessa previsão impactam diretamente os resultados dos preços, de forma que a principal causa da volatilidade do PLD é a previsão de vazões originada da previsão meteorológica.
O impacto da meteorologia nos preços de energia, se torna ainda mais evidente em períodos de eventos hidrológicos extremos (cheias ou secas persistentes). Como ocorreu recentemente, durante a crise hídrica vivenciada entre 2020/2021 nas regiões SE/CO e Sul do Brasil, quando chuvas muito abaixo da média ocorreram durante meses seguidos afetando o regime de vazões das regiões, originando o pior período de todo histórico desde 1931. Nesse período crítico, os consumidores chegaram a ficar expostos ao risco de racionamento, o que ocasionou a necessidade de tomada de medidas emergenciais para atendimento à carga, como por exemplo, despachos extras térmicos, importação de energia de países vizinhos e redução voluntária da demanda. Essas medidas auxiliaram no enfretamento à crise, porém originaram um custo alto, impactando no bolso do consumidor até hoje através de encargos extras que aumentam consideravelmente o valor final do preço da energia.
A característica estrutural das fontes da matriz energética nacional amplifica a importância de uma boa previsão meteorológica, que soma como uma importante ferramenta para auxiliar no planejamento e uso dos recursos energéticos com maior confiabilidade, contribuindo a evitar medidas extremas como cortes de carga nas regiões. Outro fato é que dados meteorológicos assertivos amparam os players a tomarem decisões estratégicas na compra e venda de energia no mercado livre.
Por fim a meteorologia não sai de cena no ambiente energético nacional, porém ainda conta com desafios para seu desenvolvimento, visto que o alto grau de incerteza nos resultados carece de constantes evoluções nos modelos e investimentos em tecnologia para que a qualidade das informações fornecidas obtenham maior precisão, auxiliando de forma mais eficaz toda cadeia eletroenergética do Brasil, assim como as demais áreas impactadas por essa ciência, como a agricultura por exemplo.
Texto elaborado pela colaboradora Ariane Teixeira Klingelfus da área de Riscos.