Após o pior período seco (maio – agosto) do histórico de 91 anos, a crise hídrica batia na porta do setor elétrico brasileiro, trazendo incertezas quanto ao atendimento da carga e discussões sobre racionamento e apagões estavam sendo avaliadas pelo governo. O panorama hídrico na região SE/CO, aonde se localizam as hidrelétricas com os maiores reservatórios do país, estava na pior condição dos últimos anos, com a ENA (energia natural afluente) média entre maio e setembro/2021 em apenas 62% MLT (média de longo termo) e o armazenamento na marca de 16,7% no inicio de outubro (16% abaixo da mesma época de 2020).
A partir desse quadro hidrológico ruim, foi de bom grado que o setor elétrico recebeu as chuvas do mês de outubro/2021, quando se configurou o início do período úmido de 2021, já que este mês iniciou com previsão de apenas 57%MLT no SE/CO e terminou efetivamente em 95%MLT, segundo dados do ONS, configurando um incremento mensal de 38% a mais de energia natural afluente.
Por outro lado, o otimismo na previsão da chuva afetou os resultados dos modelos matemáticos que calculam a operação e os preços da energia, visto que, apresentam um otimismo exacerbado com relação aos dados de entrada das vazões/ENA em comparação com outras variáveis como os níveis dos reservatórios. Portanto, mesmo partindo com reservatórios baixos, os resultados dos modelos para outubro de 2021 foram afetados pela expectativa de recuperação das vazões, sinalizando melhora nas condições de atendimento, resultando na redução do preço da energia no curto prazo (PLD), que passou de R$ 583,88/MWh em setembro para R$ 249,36 /MWh, diminuindo a quantidade de despacho térmico indicada. O que causou um contrassenso operativo, pois, para manter a confiabilidade do sistema, o ONS (com anuência do CMSE) mantém as térmicas ligadas por fora da indicação dos modelos, resultando num custo alto e inesperado que está sendo pago pelos agentes do setor através do ESS (encargo serviço do sistema).
E como foram as previsões de vazões utilizadas pelo ONS para outubro de 2021? O gráfico a seguir apresenta as previsões de vazões (ENA) atualizadas a cada semana (linhas coloridas) para o submercado SE/CO, comparando com a ENA verificada (linha tracejada em vermelho). As barras vermelhas indicam a diferença entre o previsto e verificado.
Podemos observar que com a entrada da chuva a partir da 3ª semana do mês (09/10-15/10), houve muita variação entre os valores das ENA’s previstas e verificadas, as quais quando comparadas, apresentaram diferenças de aproximadamente 6.000 à 3.000 MWmed, chegando até 22% para o SE/CO, ou seja, os modelos do setor elétrico simularam a operação considerando vazões previstas superestimadas (resultantes dos modelos meteorológicos), o que somando ao conhecido viés otimista, resultaram numa baixa prematura dos preços.
O cenário hidrológico atual melhorou, porém é de atenção e sem muito otimismo para as bacias hidrográficas do SE/CO. Segundo os meteorologistas, apesar da entrada das chuvas na época certa, é cedo para dizer como serão os meses mais úmidos do ano (dezembro – março). Atualmente estamos em La Niña, segundo NOAA, com vigência prevista até abril/2022. A La Niña afeta o regime de chuvas no Brasil, em média, favorece as regiões NE/N e desfavorece precipitações no Sul, trazendo irregularidade nos volumes de precipitação. Sendo assim, a incerteza hidrológica continua, pois o período úmido está apenas começando e o otimismo dos modelos resulta em previsões positivas no curto prazo, que vão depender da continuidade e regularidade das chuvas no longo prazo.
Autora: Colaboradora Ariane Teixeira Klingelfus
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